sábado, março 10, 2007

Da preplexidade às Ilusões Perdidas


I Parte



Na época em que vivemos, políticos e intelectuais continuam a insistir na retórica pela retórica, quando a esperança se confronta diariamente com o medo, dando aso ao crescimento do cepticismo, a resignação ou até a preplexidade dos actores, que somos todos nós.
Talvez porque estejam demasiadamente obcecados com os mistérios da governação, postados numa primeira fila da plateia da vida, numa peça da qual são protagonistas, e que por isso mesmo sejam os primeiros a ficarem espantados com o péssimo espectáculo dessa mesma política.
Sócrates é observado pela direita, que contra os mais obstinados, vai conseguindo levar por diante algumas reformas, suportado pela garantia e segurança de uma governabilidade maioritária, mesmo que para isso tenha de entrar em conflito com espaços da sociedade, que numa primeira instância, até lhe serviu como almofada eleitoral, a média burguesia.
A própria esquerda começou a deitar as unhas de fora e, com alguma preplexidade, à medida que o tempo vai passando, argumenta no seu modo tão peculiar de arregimentação de massas, tentando demonstrar que as promessas eleitorais vão caíndo no vazio da rotina e do discurso populista e governamental.

Municiando os seus ataques através dos órgão representativos dos trabalhadores, os sindicatos e respectivas centrais sindicais, acusando o governo de usar práticas e conduta neoliberal, apelidando e denunciando este tipo de políticas, como uma continuidade das politicas aplicadas nos anteriores governos do PSD, as quais visam unica e exclusivamente afrontar e por em causa os direitos dos trabalhadores.
A preplexidade desta forma de governar, tem levado os próprios seguidores e apoiantes de Sócrates, a assumirem posições antagónicas a algumas dessas decisões, como tem acontecido nas áreas da saúde e educação, da qual os Presidentes de Câmara Socialistas bem têm deixado claro, passando do período de boas graças para a crítica aberta e o confronto directo com o governo e a maioria da direcção partidária.
Os resultados têm sido visíveis e são conhecidos através da denúncia de falta de diálogo e prepotência da maioria governamental e seus ministros, provocando e tendendo a provocar a divisão da base social de apoio partidário, o qual se fez reflectir passados poucos meses, olhando-se para os resultados nas eleições autárquicas, onde essa franja de apoio mostrou o deu desencanto e admoestou a maiora de forma inequívoca, proporcionando uma derrota ao PS nas urnas com consequências que se fizeram sentir por todo o País.
Esta atitude governativa de Sócrates, é utilizada pelos mais cépticos como força retro-motriz, que em vez de se alimentar da receptividade e energias emanadas da governação socialista na relação com a sociedade civil, enfraquece e deixa cair as bandeiras de mudança e compromissos, provocando desconfiança e perda de identidade.
Diante disto, a tarefa de uma esquerda interna que vinha a disputar posições políticas no Partido, enquanto este actua despudoradamente como correia de transmissão do governo, poder-se-á considerar quase como uma tarefa inacessível e hercúlea.
A falta de esperança leva à desilusão, no entanto, não deixa de ser notável que tanto os perplexos quanto os que perderam suas ilusões confundam as críticas pertinentes com cobranças equivocadas. Há os saudosistas que criticam o PS por ter negado as origens do socialismo.
Imaginam que o partido renunciou ao espírito revolucionário de esquerda, reafirmando apelos a um socialismo sem definição, sintetizado em soluções políticas mais próximas da social-democracia, expressando uma retórica e apelando para o consenso interno, adaptando-se ao momento nas emanações que vierem do governo, não permitindo sublevações esquerdistas, esquartejando e reduzindo as tendências internas.
Para muitos, a eleição de Sócrates representava expectativa e esperança, mas começam agora a perguntar se terá valido a pena os anos dedicados à militância. É compreensível. Afinal, são vidas que se consumiram em reuniões e atividades partidárias na defesa intransigente de causas e projectos.
O crescimento do aparato partidário e a sua estatização, a acomodação interna de conveniências aos jogos eleitorais, transformam o partido numa máquina trituradora, anulando qualquer voz dissonante e abafando todo ou qualquer discurso crítico, absorvendo-o e minimizando o seu impacto pela desvalorização do seu conteúdo, reduzindo essa intervenção à participação controlada e encenada dos congressos e convenções.
Os críticos, como parte da máquina partidária estatizada, acabam por moderar ou anular os seus discursos ou divergências, perante necessidades internas concretas, impostas pelas disputas internas de processos eleitorais mais ou menos negociados.
Numa primeira análise, o erro não está em Sócrates nem no seu Governo, o erro está esse sim, na avaliação da sua postura política interna, negada na sua própria trajectória partidária.


(cont....)


Joao Carlos Soares

quinta-feira, março 08, 2007

08 de Março - Dia Internacional da Mulher

A todas as mulheres


Que amanhã continue a ser sempre o teu dia

Corrupção e Sistema (...cont)

Parte V


A corrupção é um péssimo espectáculo que enoja o cidadão comum.
Quando esse espectáculo tem como protagonistas os políticos, ainda mais desacreditada sairá a actividade política, fazendo com que os analfabetos políticos, aqueles que primam pela indiferença e detestam a política, se regozijem e fortaleçam nos argumentos pela indiferença, o não envolvimento na política, e a abstracção nas decisões em comunidade.
A ingenuidade e a moralidade abstracta, oculta e dissimula infelizmente algum egoísmo dos que não conseguem pensar nem querem ver para fora do seu casulo.
Essa indiferença contribui para a manutenção e reprodução dessa corja de ladrões que, espreitando os cofres públicos, estão sempre disponíveis e prontos para dar o golpe de asa à primeira oportunidade que tenham. Tal como Pilatos não impediu a morte de Cristo ao lavar as mãos, também aqueles que se recusam a fazer parte da decisão na sociedade a que pertencem, estão de forma inconsciente mas consequente a alimentar a corrupção.
Aqueles que vêm alimentando ou cultivando a indiferença perante a sociedade ou defendendo e promovendo o egoísmo ético de particulares, torna-os a eles próprios coniventes. Num estado democrático de direito, a gestão da coisa pública é responsabilidade de todos nós.
De uma coisa podemos estar cientes, quando os políticos deixarem de ser responsáveis e responsabilizados pelos negócios do Estado, então podemos ter a certeza que o sector público pode estar sem rumo e completamente perdido.
Meter todos os políticos no mesmo saco, nivelá-los pela mesma bitola e atribuir-lhes a podridão da corrupção em exclusividade, é um erro que não pode nem deverá ser cometido, sendo com certeza um equívoco de avaliação a evitar. É verdade que são os políticos aqueles que mais expostos estão, no entanto chamo a atenção para factores que são de extrema importância contemplar. Não há corrupção sem corruptores e corrompidos, como diz o ditado “ A ocasião faz o ladrão, a necessidade também o faz”.
Não podemos nem permitiremos que a hipocrisia nos ofusque o raciocínio e a razão. Exigimos ética e compromisso aos políticos como se esta fosse uma exclusividade restrita ao submundo da política e dos políticos. Mas e então o resto da sociedade? Quando um ladrão se apodera do alheio e o transacciona junto de receptores, estes tornam-se tão culpados quanto os autores.
Nós não procedemos assim. Só os outros é que o fazem!. Afirmam uns, desculpam-se outros.
Então como se justifica e compreende que desde que se processam alterações no xadrez político, o conhecimento, a sabedoria, a eficácia, a experiência, enfim a competência passem de um momento para o outro a fazer parte de características próprias em exclusividade dos acólitos dessa mesma força política?.
Quem de nós não subornou ou foi tentado a subornar?, mesmo que o significado do acto, pouco ou nada signifique num contexto generalizado de uma sociedade comparativa de grandezas?.
Ou não vivemos numa sociedade onde a honestidade é sinónimo de burrice, de ser trouxa, ou corremos o risco de ser bobos, quando a sociedade competitiva parece premiar os mais espertos, os egoístas, os mais ambiciosos?.
A bem da verdade, o ladrão aproveita a ocasião. Quem de nós nunca foi tentado? Quem de nós não cometeu algum deslize perante a ocasião? Quem foi tentado e não caiu em tentação? Quem conseguiu manter a coerência entre pensar e agir, discurso e prática?
Os homens têm que ser julgados pelo seu trabalho e apenas através dele é que podemos comprovar a sua capacidade de resistir à tentação.
Aos que denomino de analfabetos políticos da chamada tentação da política, o seu único prémio é a ignorância, e que muitas vezes, enojados e cansados perante o espectáculo proporcionado pelos sucessivos governos, nos seduzem a segui-los sucumbindo à rotina do quotidiano, consumindo e desgastando valores e causas.
Só as bestas não reflectem sobre a situação do Mundo e da sociedade em particular. Por mais distraído que seja, o ser humano tem capacidade e condições de criticar, compreender e projectar o seu próprio futuro. Isto é que nos diferencia dos demais animais e nos torna no único animal capaz de produzir cultura contribuindo para a sua própria história.
Não chega criticar os que prevaricam, é indispensável e aconselhável superar o comodismo a que os analfabetos políticos se submetem constantemente. Não se pode nem se deve exigir ética na política ou formar uma nova geração de cidadãos politicamente activos, consciente dos seus deveres e direitos, dotada de capacidade de poder vir a assumir a defesa da justiça social, se os nossos exemplos se pautarem pelo contrário.

Afinal de contas, até os ladrões têm a sua ética.



João Carlos Soares

sexta-feira, março 02, 2007

Bento deixou-nos



A dignidade de um homem entre os seus pares.