quinta-feira, novembro 22, 2007

Agitação ou Metamorfose?


Para que a vida se não venha a transformar numa coisa sem sentido, até mesmo absurda, as corporações em consonância com os interesses privados, terão que se colocar ao serviço de uma vida com qualidade para os cidadãos, e não exclusivamente ao serviço das suas necessidades de acumulação de riqueza, ainda sugerindo que nos devemos sentir gratos e reconhecidos pelos empregos que nos proporcionam.
Contudo, não podemos simplesmente levar a mal, ou julgar negativamente, todos aqueles que procuram a maximização dos seus capitais, rentabilizando as competências técnicas e desprezando ou descurando por completo a inteligência da vida. A nossa acção tem que se centralizar, enquanto membros de uma sociedade, na organização e racionalização de conceitos e valores, assumindo as rédeas do processo, de forma a construirmos um futuro menos comprometido e hipotecado, num universo menos violento, menos ignorante e mais humanizado.
Os idosos na nossa sociedade, membros da chamada terceira idade ou seniores, para outros, os quais muitas vezes se confinam isolados nos seus lares, começam a despertar para uma actividade organizada em grupos e associações, passando a utilizar e tirar proveito de décadas de vida útil que têm pela frente, ajudando a revitalizar a comunidade a que pertencem, animando espaços de lazer e de cultura, a exemplo da UTIB (Universidade da Terceira Idade do Barreiro), organizando o enraizamento comunitário, contribuindo com o seu imenso conhecimento humano, que é o que mais falta, em conjunto com o seu inestimável e formidável capital de tempo disponível.
Tudo isto e muito mais se poderá começar a elencar, num universo que pouco a pouco se vai descortinando, a partir do momento em que as pessoas descobrem e se apercebem de que são pessoas, de que são cidadãos e não apenas clientes de uma sociedade de consumo, como tal, são parte da sociedade e têm direitos.
Quem tiver interesse e vontade, poderá associar-se a iniciativas que existem e vão aparecendo por toda parte. O comum cidadão, já não se pode considerar necessariamente impotente, podendo utilizar o voto como factor de decisão nas suas opções de liderança, com as suas poupanças nos actos de uma qualquer aplicação financeira, com o seu trabalho voluntário no serviço e apoio a organizações da sociedade civil, as quais começam a despertar para uma realidade incontestável. É incontornável e impressionante o número de pessoas que pretendem constituir-se como agentes cívicos socialmente úteis, em contra ponto com aqueles que preferem passar a vida ostentando um sucesso individual fora de contexto, descaracterizado e vazio.
Esta análise e este mal estar que por vezes sentimos, não poderá de forma alguma ser necessariamente imputada à esquerda ou à direita, não será necessariamente apanágio do rico ou do pobre, fazer-se sentir em países desenvolvidos ou não. Este mal estar deve ser considerado mais como um mal estar resultante dos males da nossa civilização, ou cultura no sentido mais amplo deste termo.
A imaginação humana sem limites conhecidos, a sua inteligência ao serviço da inovação, através das tecnologias entretanto desenvolvidas e disponibilizadas, os imensos avanços científicos na descoberta das nossas origens, são e tornam-se insignificantes, quando comparados com as suas necessidades humanas triviais.
Sendo uma tarefa simples mas imensamente complexa, o maior desafio com que nos confrontamos actualmente, prende-se com a nossa capacidade de conseguirmos, ou não, adaptar as tecnologias e o potencial económico, ao serviço das necessidades humanas.
Torna-se necessário reencontrar algum equilíbrio, porque os sistemas, ao longo dos tempos, conseguiram gerar uma realidade desconforme, através de segmentações doentias de classes.
Perante a globalização e o universo por si gerado, dominado pela vertente mercantil vocacionada exclusivamente para o lucro, torna-se e exige-se, dos nossos dirigentes, alguma contenção na teoria exclusiva da vertente económica, de forma a ser encontrado um eixo condutor de primazia nas políticas sociais, impedindo a utilização, instrumentalização e manipulação obscena e injustificada de interesses absurdos, para voltar a colocá-la ao serviço da humanidade.
Os tempos do espectro levantado pela especulação e manipulação dos seus suportes políticos, torna-se numa rejeição cultural, transformando-se num imenso saco cheio de uma sociedade que pretende outra coisa, a qual começa já a arregaçar as mangas.
Enquanto não construirmos pela base uma sociedade que se articule entre todas as camadas sociais e assuma as rédeas do seu desenvolvimento, não poderemos esperar, nem fazer depender do surgimento ou da chegada ao poder de uma qualquer personagem redentora, para o cumprimento desta tarefa, exigindo de todos nós mais iniciativa e organização, consciência e inteligência social.


João Carlos Soares

sexta-feira, novembro 02, 2007

Violência Política ..... Social



Desde os fatídicos acontecimentos de 11 de Setembro de 2001 e das guerras no Afeganistão e no Iraque, existe a sensação de que o mundo se encontra mergulhado num banho de violência política e dominado, de uma forma assustadora, pelo terrorismo.
As imagens e os testemunhos alucinantes e perturbadores, alimentados por uma fome de protagonismo e liderança mediática, lançando o pavor entre as populações, relatando medonhos e reprováveis atentados e explosões homicidas, espalhando o horror e a insegurança, dando tudo isto a impressão de que o mundo estaria a ser varrido pelo furacão de uma espécie de novo conflito mundial, tendo como protagonistas o terrorismo internacional, de uma forma mais atroz que os anteriores.
Esta impressão não pode de forma alguma ser considerada falsa. Em contra ponto contrariando as aparências, a violência política nunca foi tão débil. As revoltas e insurreições de ordem política, as guerras e os conflitos raramente foram em tão pouco número. Por mais espantoso que isto possa parecer, e a despeito dos media, o mundo social está calmo, tranquilo, podendo até afirmar-se que se encontra em grande medida pacificado.
Para se perceber e reconhecer esta realidade, temos que retroceder vinte ou trinta anos, quando quase todos os grupos de protesto radicais adeptos da luta armada desapareceram, ou se foram extinguindo.
Salvo algumas excepções, onde uma nova forma de confronto social vem ganhando adeptos através da crença islâmica, ocupando agora a parte mais visível da cena mediática. Contudo as suas acções, por mais espectaculares que se apresentem, não conseguem disfarçar o essencial: a luta política perdeu força, e rarefez-se.
Quererá esta situação reflectir a ideia de que não existem neste momento outras formas de violência em acção?
É claro que existem, começando pela violência económica dos agentes poderosos do capital estimulados pela globalização liberal, que exercem sobre os povos dominados.
Esta pressão económica, visando o enriquecimento dos ricos, que se vão tornando cada vez mais ricos, aumentando as desigualdades com uma dimensão nunca antes vista.
Torna-se revoltante e inquietante os níveis atingidos pela pobreza, traduzidos em cerca de metade da humanidade, onde mais de um terço atingiram o limiar da miséria, cerca de 800 milhões sofrem de má nutrição, etc.etc.etc...
Por mais incrível que pareça, todos estes milhões de condenados continuam emudecidos, controlados e politicamente acomodados, tornando-se num paradoxo do nosso tempo, havendo mais pobres do que nunca e, em contrapartida, nunca ter havido ou fazerem-se sentir tão poucos revoltados.
Torna-se pouco provável que esta situação assim possa permanecer por muito mais tempo, afigurando-se a médio prazo, o regresso ao combate dos oprimidos contra os opressores, e em especial, a luta dos pobres contra os ricos, com alguma expressão actualmente, através do aumento da delinquência, da criminalidade, da insegurança, e que, um pouco por toda a parte, venham a adquirir características de uma autêntica guerra social.
Há uns anos atrás, um qualquer cidadão na posse de uma arma, aderia a uma organização de luta armada para mudar o destino da humanidade, defendendo os ideais em que acreditava. Hoje em dia, na posse de uma arma, pensa primeiro na sua própria pessoa e, por se sentir vítima da ruptura da estrutura social dominada pelos agentes económicos, irá romper com os seus compromissos de cidadania, atacando bancos, assaltando ourivesarias e gasolineiras.
Perante esta vaga ascensional de conflitos, originando como tal uma cada vez maior onda de insegurança, faz com que em muitos países a despesa orçamental utilizada nesta guerra social, ultrapasse as verbas destinadas à sua própria defesa nacional, no sentido de proteger os ricos do desespero dos pobres, reprimindo e recalcando os mais desfavorecidos com políticas de contenção nas áreas da saúde, educação e direito ao trabalho.
Não nos podemos permitir e encarar os factos como dados adquiridos. Perante o agravamento das desigualdades, os cidadãos acabam sempre por se revoltar. O actual aumento da criminalidade e delinquência, que muitas vezes não passam de formas primitivas e arcaicas de agitação social, começam por se constituir como um sinal preocupante e indiscutível do desespero dos mais pobres perante a injustiça do mundo. Ainda não se poderá designar este tipo de acção como actos de violência política, mas temos a consciência e o pressentimento que não passa de mais um adiar, que não sabemos até quando e de que forma o vamos conseguir deter.

João Carlos Soares