domingo, novembro 15, 2009

E assim se passaram 50 anos




Sem a noção do passar dos anos, e quando ainda há pouco tempo, menino e moço vivia a Revolução de Abril com tudo o que ela representava no coração dos jovens da época, que como eu sentiram este momento inesquecível, apercebo-me que cheguei aos 50 anos.
Como quem não quer a coisa, meio século de vivências se passou com alguma turbulência inevitável, outras não tanto assim, mas consciente e cada vez menos optimista quanto ao futuro, sabendo contudo que a partir de agora passarei a descontar os dias, faltando-me o tempo para concretizar projectos de uma vida, mas com uma certeza: Já não tenho pachorra nem tempo para lidar com mediocridade e ignorância gratuita travestida com opções pomposas de gente, como diria alguém a quem politicamente muito devo e que seria bom muito boa gente não esquecer, Aires de Carvalho, os apelidava de “aprendizes de feiticeiro”.
Fico inquieto quando vejo egos extravasando sadismo intelectual polido de verniz a estalar por todos os poros, de invejosos cuja única prioridade que têm na vida é tentar destruir a imagem de todos aqueles que fazem por merecer o nosso respeito e admiração.
Quando somos jovens, sonhamos utopicamente que será possível mudarmos radicalmente o mundo, acordando diariamente de sonhos revolucionários mensageiros de profecias anunciadoras do fim da miséria e das desigualdades.
Agora que a meninice passou a fazer parte de um sonho passado do faz-de-conta, não quero acreditar nem continuar a sonhar que será impossível acabar com uma sociedade com falsidades e ressentimentos, só porque as pessoas estão mais preocupadas em usar os rótulos do que a debater e defender os conteúdos, dando ouvidos a cantos de sereia autoritários, que para nossa infelicidade começam a fazer escola nos corredores da política.
Embora já não acredite em profecias e revoluções, quero e tenho o dever de, continuar a sustentar a esperança de uma sociedade que opte por um caminho de sustentabilidade apoiada na aprendizagem, ao lado de gente que pauta a sua conduta do dia-a-dia com a sabedoria prática da razoabilidade, conhecimento e racionalidade, reconhecendo e auto criticando os seus erros, não se deslumbrando com os triunfos fáceis, defendendo com humildade a vida neste mundo cada vez mais complexo e confuso.
Pertenço a uma esquerda que se pauta pela liberdade de expressão e pela defesa da democracia participativa, mas não me enquadro nem defendo atitudes de autêntica histeria e cegueira ética partidária, que facilmente perde o autocontrole.
Renuncio a qualquer tipo de convívio político com pessoas onde a razoabilidade não impere e a falta de consistência e conteúdos transforma o debate em ressentimentos recalcados dos seus fracassos, esgotando a nossa paciência e comprometendo obviamente as relações pessoais.
Passados que foram precisamente 53 anos, vou-me esforçar e tudo farei para tentar preservar na minha conduta aquilo que considero como virtudes, retocar e tornar os meus defeitos mais leves, polidos e coerentes, por forma a sentir-me melhor de bem com a vida.

João Soares

quinta-feira, novembro 12, 2009

ILUSÃO E PERPLEXIDADE




Ao folhearmos as páginas de um jornal, ao fazer zapping com o comando da televisão, confrontamo-nos com um espectáculo nojento protagonizado por uma corja de malfeitores, os quais sempre atentos a uma oportunidade, espreitando os cofres públicos, aprontam os seus golpes, sem que a justiça leve até ao fim a sua função, e os meios à sua disposição possam ter consequências visíveis, fazendo com que a tentação não faça o tentado.


Todos aqueles que quando abordados politicamente respondem prontamente que não querem nada com a política, não percebem, ou não sabem que a sua indiferença ajuda a contribuir para a manutenção desses ladrões e oportunistas, fortalecendo os argumentos com a sua indiferença e o não envolvimento na vida política os podres putrefactos instalados.


A simples afirmação do cidadão comum, não quero nada com a política, abre espaço e alimenta a reprodução desta corja indesejável num estado de direito, porque o cultivar da indiferença pelo que se passa no país, o egoísmo ético e o interesse de cada um em particular, fazem desse mesmo cidadão conivente com as políticas e decisões tomadas por quem os governa.


Não é justo nivelar ou tratar todos os políticos como corruptos e lançar todas as culpas apenas a estes, pois os políticos pela própria actividade que desempenham, ficam muito mais expostos, mas de uma coisa não nos podemos esquecer, não existe corrupção sem corruptores e corrompidos.


Quando numa sociedade se começa a instalar a ideia de que honestidade passa a ser sinónimo de burrice e até correr o risco de ser apelidado de parvo, quando essa sociedade pela sua competitividade e ganância premeia os mais espertos, ambiciosos e egoístas em detrimento dos mais capazes e competentes, por quanto tempo conseguirá fazer prevalecer e manter a coerência entre o pensamento e acção, discurso e prática de quem exerce o poder.


Por vezes somos tentados a abstrairmo-nos da coisa pública e tentação da política, mas tomando essa opção estamos de certeza a contribuir para um crescimento e ignorância do que nos rodeia, sucumbindo às rotinas do dia-a-dia consumindo-nos o pensamento e tornando-nos anestesiados e incapazes, criando e dando uma ilusão de felicidade.


Só os tolos não reflectem sobre o que os rodeia, por mais alienado que o ser humano seja, tem todas as condições de pensar de forma crítica, compreendendo e projectando o que pretende.


Vivemos numa sociedade onde a esperança de dias melhores começa a ser confrontada com o medo de assumir política e intelectualmente posições claras e desprendidas de facciosismo bacoco, sempre que necessário, não nos resignando e não cedendo a qualquer tipo de pressões, tenham elas as origens que tiverem.


É indispensável evoluir-se deste estado de perplexidade com que somos confrontados todos os dias, para uma crítica aberta e o confronto directo com formas autistas e imorais de gestão da coisa pública, exigindo a punição dos detractores com mão pesada pela justiça.


A crítica publica não pode nem deve ser considerada suspeita, nem o direito de usar a sua consciência poderá condicionar quem quer que seja de poder usar o direito de intervir. Não podemos fechar os olhos, só porque algo ou alguém melhor posicionado hierarquicamente numa estrutura partidária assim entende, nem deixar que influências de interesses pouco ou nada condizentes com a vontade e o desejo das populações assim o exige. Os políticos têm o dever de dar o melhor de si no desempenho das suas funções de estado, mesmo que para isso tenham que assumir posições não concordantes com a sua própria estrutura partidária.


O desespero das populações conduzem a sociedade para a descrença, a desilusão e perplexidade de todos quantos acreditaram numa militância dedicada à defesa de conceitos e formas de desenvolvimento coerentes com a realidade e necessidades correntes das famílias.


Se a ruptura com os partidos de alguns desiludidos se pode imputar a aspectos conjunturais, equivocam-se duplamente, porque a política dá muitas e diversas voltas e o que é hoje criticado, é amanhã reconhecido pelos que nos passam um cheque de confiança nos processos eleitorais face aos resultados obtidos.


A concretização e a prática de boas políticas reforçam a tomada de posição daqueles que perante o contraditório político partidário optam pela sua consciência, numa prova de esclarecimento, ética e moral, porque mais vale a decisão de procurar outros rumos e viver a vida, do que persistir num papel passivo de conspirador.


Vale mais ser lembrado pelo que fizeste, do que pelo que pretenderam que deixasses de fazer.

João Soares

terça-feira, novembro 10, 2009

Artigo de Clara Ferreira Alves - Expresso

Pela pertinência do artigo e actualidade apeteceu-me publicá-lo no blog, para aqueles que não tenham tido a oportunidade de ler.

Não admira que num país assim emerjam cavalgaduras, que chegam ao topo, dizendo ter formação, que nunca adquiriram, que usem dinheiros públicos (fortunas escandalosas) para se promoverem pessoalmente face a um público acrítico, burro e embrutecido.


Este é um país em que a Câmara Municipal de Lisboa, desde o 25 de Abril distribui casas de RENDA ECONÓMICA - mas não de construção económica -
aos seus altos funcionários e jornalistas, em que estes últimos, em atitude de gratidão, passaram a esconder as verdadeiras notícias e passaram a "prostituir-se" na sua dignidade profissional, a troco de participar nos roubos de dinheiros públicos, destinados a gente carenciada, mas mais honesta que estes bandalhos.

Em dado momento a actividade do jornalismo constituiu-se como O VERDADEIRO PODER. Só pela sua acção se sabia a verdade sobre os podres forjados pelos políticos e pelo poder judicial. Agora contínua a ser o VERDADEIRO PODER mas senta-se à mesa dos corruptos e com eles partilha os despojos, rapando os ossos ao esqueleto deste povo burro e embrutecido. Para garantir que vai continuar burro o grande cavallia (que em português significa cavalgadura) desferiu o golpe de morte ao ensino público e coroou a acção com a criação das Novas Oportunidades.

Gente assim mal formada vai aceitar tudo e o país será o pátio de recreio dos mafiosos.

A justiça portuguesa não é apenas cega. É surda, muda, coxa e marreca.

Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso, apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção. Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo "normal" e encolhem os ombros. Por uma vez gostava que em Portugal alguma coisa tivesse um fim, ponto final, assunto arrumado. Não se fala mais nisso. Vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada.

Desde os Templários e as obras de Santa Engrácia, que se sabe que,nada acaba em Portugal, nada é levado às últimas Consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado.

Da morte de Francisco Sá Carneiro e do eterno mistério que a rodeia, foi crime, não foi crime, ao desaparecimento de Madeleine McCann ou ao caso Casa Pia, sabemos de antemão que nunca saberemos o fim destas histórias, nem o que verdadeiramente se passou, nem quem são os criminosos ou quantos crimes houve.

Tudo a que temos direito são informações caídas a conta-gotas,pedaços de enigma, peças do quebra-cabeças. E habituámo-nos a prescindir de apurar a verdade porque intimamente achamos que não saber o final da história é uma coisa normal em Portugal, e que este é um país onde as coisas importantes são "abafadas", como se vivêssemos ainda em ditadura.

E os novos códigos Penal e de Processo Penal em nada vão mudar este estado de coisas. Apesar dos jornais e das televisões, dos blogs, dos computadores e da Internet, apesar de termos acesso em tempo real ao maior número de notícias de sempre, continuamos sem saber nada, e esperando nunca vir a saber com toda a naturalidade.

Do caso Portucale à Operação Furacão, da compra dos submarinos às escutas ao primeiro-ministro, do caso da Universidade Independente ao caso da Universidade Moderna, do Futebol Clube do Porto ao Sport Lisboa Benfica, da corrupção dos árbitros à corrupção dos autarcas, de Fátima Felgueiras a
Isaltino Morais, da Braga Parques ao grande empresário Bibi, das queixas tardias de Catalina Pestana às de João Cravinho, há por aí alguém quem acredite que algum destes secretos arquivos e seus possíveis e alegados, muitos alegados crimes, acabem por ser investigados, julgados e devidamente punidos?

Vale e Azevedo pagou por todos?

Quem se lembra dos doentes infectados por acidente e negligência de Leonor Beleza com o vírus da sida?

Quem se lembra do miúdo electrocutado no semáforo e do outro afogado num parque aquático?

Quem se lembra das crianças assassinadas na Madeira e do mistério dos crimes imputados ao padre Frederico?

Quem se lembra que um dos raros condenados em Portugal, o mesmo padre Frederico, acabou a passear no Calçadão de Copacabana?

Quem se lembra do autarca alentejano queimado no seu carro e cuja cabeça foi roubada do Instituto de Medicina Legal?

Em todos estes casos, e muitos outros, menos falados e tão sombrios e enrodilhados como estes, a verdade a que tivemos direito foi nenhuma.

No caso McCann, cujos desenvolvimentos vão do escabroso ao incrível, alguém acredita que se venha a descobrir o corpo da criança ou a condenar
alguém?

As últimas notícias dizem que Gerry McCann não seria pai biológico da criança, contribuindo para a confusão desta investigação em que a Polícia
espalha rumores e indícios que não têm substância.

E a miúda desaparecida em Figueira? O que lhe aconteceu? E todas as crianças desaparecidas antes delas, quem as procurou?

E o processo do Parque, onde tantos clientes buscavam prostitutos,alguns menores, onde tanta gente "importante" estava envolvida, o que aconteceu?

Arranjou-se um bode expiatório, foi o que aconteceu.

E as famosas fotografias de Teresa Costa Macedo? Aquelas em que ela reconheceu imensa gente "importante", jogadores de futebol, milionários, políticos, onde estão? Foram destruídas? Quem as destruiu e porquê?

E os crimes de evasão fiscal de Artur Albarran mais os negócios escuros do grupo Carlyle do senhor Carlucci em Portugal, onde é que isso pára?

O mesmo grupo Carlyle onde labora o ex-ministro Martins da Cruz, apeado por causa de um pequeno crime sem importância, o da cunha para a sua filha.

E aquele médico do Hospital de Santa Maria, suspeito de ter assassinado doentes por negligência? Exerce medicina?

E os que sobram e todos os dias vão praticando os seus crimes de colarinho branco sabendo que a justiça portuguesa não é apenas cega, é surda, muda, coxa e marreca.

Passado o prazo da intriga e do sensacionalismo, todos estes casos são arquivados nas gavetas das nossas consciências e condenados ao esquecimento.

Ninguém quer saber a verdade. Ou, pelo menos, tentar saber a verdade.

Nunca saberemos a verdade sobre o caso Casa Pia, nem saberemos quem eram as redes e os "senhores importantes" que abusaram, abusam e abusarão de
crianças em Portugal, sejam rapazes ou raparigas, visto que os abusos sobre meninas ficaram sempre na sombra.

Existe em Portugal uma camada subterrânea de segredos e injustiças, de protecções e lavagens, de corporações e famílias, de eminências e reputações, de dinheiros e negociações que impede a escavação da verdade.

Este é o maior fracasso da democracia portuguesa

Clara Ferreira Alves - "Expresso"

Incerteza, Desnorte e Falsas Promessas

A incerteza no dia-a-dia e a insegurança no nosso quotidiano aumentam a angústia das populações, que se sentem desprotegidas por um sistema social desequilibrado.

O desnorte de algumas famílias e a perplexidade perante as informações e interpretações contraditórias da instabilidade económica do país levam os cidadãos a interrogar-se, desesperadamente, sobre o rumo da sociedade e das suas vidas.

Esta situação conduz, cada vez mais, as famílias encurraladas e sujeitas a uma violência quotidiana do meio social onde se enquadram, vivendo permanentemente um pesadelo carregado de absurdos em cujo sentido não encontram razão ou análise racional.

As falsas promessas de desenvolvimento, sempre presente nos discursos mentirosos de alguns lideres governamentais, dos políticos corruptos, cuja ganância insaciável e voraz, controlada por elites instaladas no sistema, conduzem cada vez mais as famílias a uma autodestruição e revolta violenta numa estrutura social já de si frágil.

Para combater essa tendência destrutiva e conduzir para caminhos que possam resgatar os valores que dão sentido à vida, individual e colectiva, pode e deve ser invertida essa tendência, exigindo-se moral e ética a quem tem o dever e a obrigação de o fazer, que são os políticos que nos governam.

O desempenho com apego e convicção nas lides do poder, deve e tem que ter, dos seus protagonistas uma face visível e nunca uma máscara onde a pouca vergonha, o vale tudo da ganância insansiável de gente sem escrúpulos se sobrepôem ao dever de servir e gerir a causa pública. O poder pelo poder não pode servir nem deve ser usado pelos seus detentores, mas sim para ser exercido com honestidade, verdade e acima de tudo com muita coerência e sensatez.

Para que a ética e a moral prevaleçam na sociedade, torna-se necessário que exista e se cumpra um código de conduta baseado em valores, consentido e praticado pela classe política, baseado em manifestações concretas de cooperação e solidariedade, inserido numa organização social pluralista e de democracia participativa, transcendente a todos os outros sistemas de crenças e valores, como súmula da consciência humana no direito dos cidadãos à sua liberdade e felicidade.

Para uma sociedade de cidadãos activos, participantes e confiantes no futuro, fonte da liberdade que transformou a história, essa democracia participativa não pode nem deve ser vista como ficção ou sonho, mas sim como uma visão de futuro na construção de um discurso em que não se tenha medo do confronto de valores nem do seu impacto real e mais que provável na existência humana à luz de experiências políticas e práticas acumuladas ao longo dos tempos.

Deve-se exigir ética e moral como dever dos nossos governantes, numa visão da humanidade inspirada numa aprendizagem de gerações, em conformidade com os actores sociais, de uma forma racional, que se pode e deve vir a manifestar no futuro, onde a razão comande e oriente as paixões para um grau de confiança das pessoas na possibilidade de uma concreta realização do verdadeiro potencial da sociedade .

João Soares