quarta-feira, setembro 29, 2021

 EDUCAÇÃO GERACIONAL

Torna-se evidente compreender e ajudar a educar as novas gerações, com serenidade e inteligência, evitando a todo o custo, uma fissura repentina e agressiva com o passado, consolidando o presente sem hipotecar o futuro.

Deverá considerar-se e distinguir, as diferenças entre geração familiar, geração social e geração material, esta última fundamentada no enfraquecimento de ideologias.

As sucessivas gerações numa mesma família, concretizam o protótipo que explica a sucessão de tradições culturais na sociedade. Na senda desta análise, exige-se uma total demarcação da noção de geração biológica ao apregoarem-se os fundamentos do conceito de gerações com memória, associado a uma experiência comum e a valores partilhados por um conjunto de indivíduos.

De referir que o conceito de geração, corresponde a um fenómeno cuja natureza é essencialmente cultural, consistindo num grupo de pessoas nascidas na mesma época, e que viveu os mesmos acontecimentos sociais durante a sua formação e crescimento. Este grupo partilha as mesmas experiências, de forma significativa, originando uma consciência comum que permanece ao longo do respectivo percurso de vida. A acção de cada geração, em interacção com as imediatamente precedentes, provoca quase sempre, tensões potenciadoras de uma mudança social, através de um desenvolvimento intelectual da sociedade, como dominador comum nas comunidades.

Sobre os valores e princípios, os mesmos não passam de uma simples tábua de tempo geracional, de sucessivos amontoados estratificados, e que no tempo, com uma análise cuidada, poderá traduzir-se em algumas transformações e movimentos no campo dos valores e princípios.

De uma forma geral, num determinado momento, que pode ser o actual em Portugal, coexistem uma desafectação dos valores tradicionais, como atitudes progressivas, defensivas e conservadoras, por isso mesmo mais enraizados, investindo as novas gerações, de uma forma crescente, em novos valores, que poderão implicar novas formas de militância, como sejam os valores que se prendem com a defesa do meio ambiente, igualdade de género, entre outros.

Os tempos e as épocas sucedem-se de forma contínua, e apenas os testemunhos históricos nos dão evidências sobre a articulação entre as gerações. Como resultado, através de uma educação equilibrada e coerente, uma geração deverá transmitir à seguinte, uma determinada base de conhecimentos e, deste modo, apesar de uma geração vir a ser substituída nos vários domínios sociais, acaba por continuar a exercer a sua influência e, em bom rigor, mantem-se, ainda que não diretamente, de forma participativa na orientação dos destinos da sociedade.

Podemos igualmente apurar e relacionar este fenómeno em cada época, o qual se altera de acordo com a sucessão de geração em geração, o que corresponde ao intervalo de tempo em que um novo conjunto de indivíduos atinge a maturidade e assume determinadas posições na sociedade.

A cada geração, a influência não é apenas da geração predecessora, mas de toda a história da humanidade, por ter conduzido àquele momento, e é a partir de um acontecimento marcante que se constitui uma nova geração. Havendo um acontecimento que atribua unidade e coerência a uma geração, como aconteceu com a Revolução de 25 de Abril de 1974 em Portugal, os rumos da geração podem, deste modo, ser explicados por esse acontecimento unificador, mas que, após algumas décadas, é ultrapassado no tempo, através de novas necessidades e conceitos comunitários, dando origem a uma nova geração de cidadãos.

A caracterização de uma geração baseia-se num conjunto de vivências comuns, valores, visão de vida, cenário político-social e a aproximação de idades. Estas características, comportamentos e valores diferenciam uma geração da outra e influenciam o modo de viver dos indivíduos nas sociedades.

As gerações partem de uma herança sócio-cultural comum, no entanto, as circunstâncias e alterações sócio-culturais que têm de enfrentar, bem como as condições específicas das regiões em que habitam, acabam por redundar numa outra característica que é a de não se parecerem umas com as outras. A partilha destas condições de existência comum pode ser perspectivada como um dado inerente à idade e ao efeito de agregação geracional, ou remetido para circunstâncias de motivação mais específicas. Mas o simples facto de existir um conjunto de indivíduos, numa faixa delimitada de idades, coloca-os de forma clara perante o mesmo tempo histórico e cultural.

Todavia, pode-se afirmar que as conjunturas históricas influenciam as vivências e as referências das diferentes gerações, tal como se de uma matriz se tratasse, já que, se entendermos a geração como um núcleo de indivíduos que nasceu numa mesma época, em virtude dessa circunstância, partilha a mesma conjunção de necessidades e factores. Pese embora esta análise, as gerações de um determinado momento histórico poderão estar confrontadas com condições de vida muito distintas, devido a outros factores condicionantes, tais como classe sócio-económica, nível educacional, ou nacionalidade.

O que se aconselha, porém, é não menosprezar e ter o cuidado de não confundir o conceito de geração com o de grupo etário, já que a geração é caracterizada não apenas pela faixa etária que a delimita, mas principalmente pelo conteúdo cultural que simboliza e que actua como elemento diferenciador.

As gerações que nasceram após uma grave crise, num período de rejuvenescimento e de instauração de um novo paradigma, que tende a projectar-se através do facilitismo e ambição  desmedida, tarde reconhecem que estão a ser tratadas com permissividade, acreditando em valores dúbios e de ordem moral duvidosa, por oposição às gerações que se preocupam com o sentido prático dos aspectos da vida, no respeito pela ética. Estes indivíduos tendem a ser moralistas, incentivando outros, em nome das suas prioridades e interesses.

Por outro lado, há gerações que despontam durante o acordar de um novo paradigma, e enquanto jovens adultos pautam a sua conduta social pela afronta às regras instituídas e ao poder democraticamente validado. Tornam-se alienados enquanto jovens, adquirem pragmatismo durante a idade adulta, tornando-se líderes durante uma época de crise, e envelhecem como indivíduos resilientes.

Culminando esta extrapolação geracional, existe ainda um grupo que nasce após uma época de despertar, de novas sensações, durante um período de pragmatismo e auto-afirmação. Enquanto crianças, estes indivíduos ou são super-protegidos, ou sujeitos a privações em adolescentes, em adultos, numa época de crise, promovem o trabalho em equipa, e  mais tarde, com o decorrer dos anos afirmam-se como pessoas optimistas e com enorme protagonismo. Envelhecem debaixo de ataque cerrado, fruto de um novo despertar. No decurso da história, esta geração está relacionada com importantes triunfos militares, por vezes com impacto violento e nefasto nas populações, exercício de cidadania e, mais recentemente, com o despontar das novas tecnologias.

Os indivíduos nascidos durante uma crise, onde se exige o sacrifício pessoal em prol do bem comum, crescem sob grande pressão, tornam-se adultos conformados, após a crise, e na meia-idade, orientam o seu foco para os processos emergentes, e envelhecem como pensadores nesse novo despertar. 

João Carlos Soares

Barreiro, 29 de Setembro de 2021