quinta-feira, janeiro 26, 2012

O Outro Paradigma das crises


As discussões ao mais alto nível, numa concertação macabra entre os países mais ricos, ou onde a instabilidade financeira ainda não se faz sentir, começa a ganhar consistência, assumindo oposição às estratégias políticas que se vão perfilando como recomendáveis no seio da União Europeia, para salvar os países em graves dificuldades financeiras.
A tragédia que se avizinha e começa a viver actualmente na Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália, quer queiram quer não, alastrará a passos largos a outros países da União, pelo efeito dominó provocado, deixando de ser um problema exclusivo destes cinco países, consumindo as economias e alastrando esta bolha a todos sem excepção, criando-se uma situação preocupante de endividamento.
Mais cedo ou mais tarde, também a França, os Estados Unidos e o Brasil, com dívidas públicas gigantescas, sofrerão do mesmo problema, arriscando-se a um colapso das suas estruturas financeiras e económicas, gerando-se uma situação de insolvência generalizada com repercussões incalculáveis.
Só com uma arquitectura financeira baseada em novos padrões de desenvolvimento, será possível ultrapassar-se as causas da crise globalmente instalada. Parecendo surpresa para a maioria dos cidadãos, o mesmo já nos espanta ter sido da parte daqueles que, com responsabilidade, conduziram as finanças públicas a este descalabro.
O sistema capitalista assenta a sua génese no poder de concentração para fazer circular a riqueza, através do sinistro mecanismo dos juros compostos, que não representam qualquer tipo de riqueza real para os países, sendo utilizados como principal móbil na acumulação de receita para o grande capital através dos mais diversos esquemas financeiros, elevando por sua vez de forma exponencial o total já inflacionado do valor das dívidas.
Desta forma, as oscilações nos mercados deixaram de flutuar face ao funcionamento da economia real dos países, e sim na contingência da especulação financeira, resultado dos empréstimos concedidos aos países em dificuldades que deveriam funcionar como pacotes de salvamento e não como novos e sobrecarregados empréstimos, que se vão juntar à já impagável dívida existente.
Não havendo qualquer hipótese, ou estratégia de investimento necessários para a recuperação do aparelho produtivo, não adquirindo por isso condições de desenvolvimento sustentável, estes países vêem o valor das suas dívidas aumentar de dia para dia, onde os pagamentos incidem praticamente na amortização de juros, enquanto se assiste ao aumento drástico do valor primordial da dívida, com a aplicação de juros sobre juros do capital em dívida, sobejamente superiores aos que vão pagando, como se de uma bola de neve se tratasse.
E assim sendo, os governos tornados lacaios de uma exploração capitalista desmedida, perpetuam esta dívida descomunal nas costas das populações, chamados a todo o tipo de sacrifícios, enquanto fica garantido de forma especulativa o ganho e acumulação de riqueza para os donos do capital.
O refinanciamento do sistema bancário, não é mais do que alimentar uma máfia ao serviço das financeiras, responsáveis e principal instrumento que levou à crise de 2008 e que continua a preparar mais um round para os anos que se aproximam.
O uso de fundos ou empréstimos públicos para salvar bancos privados, que vem sendo praticado pelos governos, é ilegítimo, indecente e contraria na sua essência, toda a lógica própria do capitalismo.
Se houvesse vontade e intenção para enfrentar as causas e contribuir para a solução da crise, teria que se auditar integralmente e com a maior transparência as dívidas públicas de todos os países sobre endividados, identificando e acusando criminalmente os responsáveis pela dívida ilegítima contraída, apresentadas as conclusões dessas auditorias e os resultados contabilizados sobre as economias. Expor publicamente as consequências, permitindo assim o plebiscito das populações sobre as dívidas a pagar ou não, bem como as condições para o seu pagamento, sem prejuízo das condições de vida e necessidades das populações, anulando e renegociando um método de juros que não conduzisse à acumulação de juros compostos (juros sobre juros) na nova estrutura financeira, impedindo desta forma que a dívida se torne exagerada e incomportável.
É fundamental, necessário e indispensável disciplinar o encargo da dívida financeira, à capacidade solvente e às prioridades de cada país, reestruturando os instrumentos jurídicos adequados, criando legislação que limite e condicione o pagamento da dívida, a fim de dar condições e capital resultante do orçamento do estado para investimento, substituindo a fórmula dos juros compostos, até agora aplicados, pelos juros simples.
Quer o comportamento dos governos, quer as medidas consideradas e levadas a efeito pelos responsáveis na condução dos destinos da União Europeia, frente à crise instalada e na falta de soluções com coragem e determinação, colocam cada vez mais em risco a democracia, o respeito à pluralidade e sobrevivência dos seus povos.
Esta situação é ainda mais agravada, no nosso país, pelo facto de que desde a ofensiva neoliberal desencadeada com a crise da dívida vivida nos anos oitenta, que levou o governo a privatizar muito do património público conquistado em Abril de 74, entregando-se áreas fundamentais e estratégicas da nossa economia, tornando-se assim altamente vulnerável à descarada e enganadora benevolência dos capitalistas internacionais.
João Carlos Soares
Barreiro, 26 de Janeiro de 2012

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