terça-feira, fevereiro 20, 2007

Corrupção e Sistema (...cont)

Parte III

Nada pode ser mais preocupante em qualquer sistema democrático, que o aumento da falta de confiança nos representantes eleitos.
Nesse momento, toda a sustentabilidade e legitimidade na qual o sistema se alicerça, cai por terra, desmoronando-se fatidicamente, abrindo caminhos a movimentos duvidosos, proporcionando a ascensão de déspotas oportunistas, os quais servindo-se do efeito dominó, fácilmente ganham apoios e congregam em seu redor órfãos de uma sociedade em rotura.
É indispensável que os partidos comecem a perceber este binómio, desenvolvendo políticas que se enquadrem em respostas efectivas às necessidades dos mais desfavorecidos, decisões estratégicas equilibradas, onde a transparência e a lucidez dos seus dirigentes, torne a conquistar, ganhando a sua confiança, aqueles que foram perdendo quando se esqueceram a quem serviam.
É verdade que estamos na era do descartável, é verdade que estamos no tempo em que as mais valias se sobrepôem aos valores de uma sociedade justa, é verdade que nos esquecemos de onde vimos, mas não podemos esquecer como e para onde queremos ir, e que esse objectivo nunca poderá vir a ser atingido, sem que haja coragem para romper e quebrar estigmas, afrontar e confrontar ideias e preconceitos, sobrepondo sem qualquer tipo de receio a razão e a justiça.
Só assim a população que nos elege voltará a acreditar nos seus representantes.
Vale a pena observar que essa descrença e falta de confiança não se resume a este ou aquele partido ou facção política, mas tornou-se nos últimos tempos, num crescendo que varre todos, sejam eles de esquerda, centro, direita ou radicais.
A prática nos partidos das estratégias de terra queimada e descarado clientelismo, têm de uma forma quase acintosa gerado feridas dilacerantes no seio da militância partidária, as quais se fazem sentir, a cada dia que passa, numa contestação e num contraditório sem freio, atentando contra tudo e contra todos, num claro desafio à liderança, quartando toda ou qualquer hipótese de concretização dos objectivos programáticos definidos e consignados nos programas sofragados.
Esta crise que atinge a sociedade portuguesa, não sendo uma exclusividade da esquerda, torna-se mais notada, em virtude dessa mesma esquerda não ter a coragem de assumir em primeiro lugar a defesa dos interesses daqueles com quem se identifica, e dos seus executores se colocarem numa situação egoista, preocupados consigo próprios num quadro institucional de poder, salvaguardando os seus interesses directos em detrimento daqueles que os elegeram e em quem confiaram o seu futuro.
A classe política tem que entender que tal como referi no início deste texto, estamos numa era em que cada vez mais o descartável é regra, mas não poderemos, nem consentiremos que nos tratem como um qualquer assalariado, em que os únicos direitos que lhes são reconhecidos e consignados são a obediência, a ignorância e a resignação.
A estatização dos partidos, resultante da dependência dos mesmos enquanto poder, serve e aplica-se conscientemente para evitar tudo quanto possa contradizer, ou por em causa o Governo. Esta teoria serve e é o mesmo que dizer, que os partidos desvirtuam e deformam os seus conceitos e crenças, transformando-se em organizações permanentemente ameaçadas pelo poder estatal, num forte, envolvente e sufocante abraço, a todos aqueles a quem deveriam proporcionar uma cada vez maior qualidade de vida.
Pelo contrário, aquilo a que somos chamados a assistir como testemunhas, não passa de um pesadelo criado pelas elites, onde os interesses dos mais desfavorecidos só servem para ilustrar caricaturas de mau gosto, onde o que apenas não mudou, continua a ser o discurso político do partido.


(cont...)
João Carlos Soares

Sem comentários: