Que maior engano, pensarmos que
somos livres, só porque escolhemos os nossos representantes nas urnas. Este
sentimento de liberdade que a democracia nos proporciona, é enganador, pois
essa liberdade termina, logo que esses representantes são eleitos, e nos
apercebemos de que a vontade geral é subjugada e traída, sendo um acto político
de manifestação colectiva organizada e fundada nas ideias de liberdade e de
igualdade, transformando esse mesmo acto de liberdade, num momento penoso de
descrédito na própria democracia.
É cada vez mais notória, a
articulação de forças de direita que sempre ocuparam o poder do Estado,
tratando-o como se de propriedade privada se tratasse, através de uma
estratégia que faz sangrar esta débil democracia, desmoralizando o povo português
e criando uma atmosfera que lhes permite voltar a ter esperança de um regresso
ao passado.
Não podemos, nem devemos
permitir ingenuamente que as transformações político-sociais alcançadas depois
de Abril de 1974, sejam desmontadas por parte destas elites conservadoras,
representantes de um estado protofascista, inimigo de uma democracia
participativa de cariz popular.
Seria uma grande
irresponsabilidade e vergonhosa traição, da nossa parte, renunciar aos ideais
de Abril, permitindo a esta podre corja política, repor e assumir um Estado de
medo e afrontamento às elementares regras da democracia e direitos dos
cidadãos.
Esta direita corrupta e aliada,
PSD + CDS, desrespeitando constantemente os direitos de igualdade de todos os
cidadãos, mostra-se agora desavergonhadamente feliz, porque tendo conseguido
arrombar os cofres e reservas produtivas no País, através da destruição de toda
a estrutura de produção da sociedade Portuguesa, julga ter conseguido o
objectivo a que se propôs, e achar que finalmente vai ter a oportunidade de
voltar a colocar esse povo que reclama os direitos adquiridos na Revolução dos
Cravos, no lugar que sempre entenderam lhe competia historicamente, mantido subjugado,
na ignorância e silenciado, não incomodando quem acumula riqueza.
Esta aspiração tem como objecto
chegar ao Estado mínimo, debilitando a sociedade civil e abrindo espaço às
privatizações e ao domínio dos mercados, até conseguir a passagem para uma
sociedade de puro mercado, no qual tudo se transforma em mercadoria.
E conseguiram, através de uma hegemonia
sonhada por Sá Carneiro, um presidente, um Governo, uma maioria parlamentar
PSD/CDS, que agora se alinhou ao que pensava ser o marco mais moderno e eficaz
da política mundial, privatizando os bens públicos rentáveis, em detrimento ao
interesse geral.
Como consequência deste tipo de
opção política, criou-se um fosso abissal entre os poucos que dominam os
capitais e as finanças e o resto da nossa sociedade, sacrificando um povo
inteiro, sem qualquer consideração, no culto do mercado e da voracidade dos
banqueiros, à sombra de uma suposta crise económico-financeira no seio da
Comunidade Europeia.
Cúmulo dessa perversidade, foi,
afinal de contas, o Estado, que somos todos nós, que os salvaram da completa
falência, originada por decisões e escolhas montadas sobre a mentira e a
ganância desmesurada desses banqueiros, que continuam alegremente rindo de
todos nós, quando deveriam estar todos na cadeia como criminosos, resultado da
especulação financeira implementada e consentida pelo órgão regulador, o Banco
de Portugal.
Perante estes factos, para além
de criticarmos a nossa classe política, por ser corrupta e o próprio Estado,
por ser refém de uma economia neoliberal, para levarmos a água ao moinho, não
chega gritar na rua contra as tramoias da direita, sem consequências, mas
começar a pensar no uso de outras medidas mais radicais, para limpar estes
pulhas dos corredores do poder.
A possibilidade de invertermos
esta tendência neoliberal, está nas ruas, basta sabermos canalizar a sua enorme
energia mobilizadora, dinamizando em todas as cidades acções públicas de
esclarecimento, espaços de deliberação pública e de participação directa para
construir com o Povo propostas sobre a verdadeira realidade do País, através de
uma introspeção sobre o sistema político, como sejam, a taxação das grandes
fortunas e do capital, a progressividade tributária, uma maior pluralidade e
independência dos meios de comunicação social, a sustentabilidade social,
ambiental e cultural, a reforma republicana do Estado e tantas outras disputas,
para assim podermos influenciar as políticas de futuros governos.
Para conseguirmos barrar as
articulações da direita e a ascensão ao poder de políticas castradoras dos
direitos consignados pela Constituição, é preciso encontrar uma orientação
ética, que nos ajude a alinhar as nossas práticas para superar a crise em que
nos meteram, neste quadro dramático de descrença e suspeição das instituições,
com um discurso que seja comum a todos e que possamos concretizar, reclamando
reformas políticas de base que se direcionem na resposta efectiva à ambição há
muito reclamada pelo povo nas ruas, pelo direito que lhes é devido ao trabalho,
à saúde e educação.
Constatamos neste particular
que, à medida que crescem os danos provocados na sociedade e na qualidade de
vida das populações, cresce simultaneamente a consciência de que em mais de 90%
das situações, tais danos se devem à actividade irresponsável e premeditada de
alguma classe política, mais especificamente, aquelas elites instaladas no
poder económico, político e cultural, que se constituem em grandes corporações
e que assumem por sua conta os rombos a provocar no equilíbrio sustentável das
sociedades.
Tudo será inconsequente, se não
estabelecermos códigos éticos reconhecidamente válidos, baseados
fundamentalmente na verdade e justiça, afirmando a liberdade e o respeito na
vida quotidiana do Povo Português.
Não me parece ser necessário
ter a sensibilidade apurada e o saber de um bom analista político, para sentir
no ar que o golpe final há muito vem sendo perpetrado e a ganhar forma, daí a
necessidade de estarmos com os olhos bem abertos, atentos às forças
reacionárias que comandam o nosso País, que anseiam pelo regresso do período do
obscurantismo que nos martirizou por quatro décadas.
João Carlos Soares
Barreiro, 19 de Agosto de 2014
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