domingo, maio 06, 2007

Viver ou não Viver da Política






Existem só duas maneiras de se estar na política para que uma verdadeira independência pública seja o garante no cumprimento de tão nobre função de cidadania.
Viver dela e para ela.
Deixando de lado os oportunistas e bajuladores bem como todos aqueles que para garantir o poder, até são capazes de vender a alma ao diabo, mesmo aqueles que vivem por ideais, os que defendem uma ideologia, transformando a defesa dessa ideologia política como a essência e razão do seu viver, mesmo esses estão constantemente expostos ao reino das necessidades, tornando-se necessário e indispensável fundir os interesses particulares aos interesses comuns e vice-versa.
Por mais disponíveis e solidários que sejam, ou pareçam ser, seria de todo absurdo exigir-lhes que vivam como eremitas ou franciscanos.
Tal como na origem de outro tipo de ordens sociais, as quais nascem de gestos de abnegação dos seus fundadores e, ao evoluírem, vêm-se perante a acumulação simultânea de capital económico e simbólico, vindo mais tarde ou mais cedo a negar o seu status original.
Cria-se um mito que o vincula ao passado, mantendo-se a retórica, perdendo-se os escrúpulos, por outras palavras, usando um discurso pretensamente fiel aos objectivos que deram origem e motivaram a sua constituição, encobrindo dessa forma, no fim de contas, uma prática conservadora.
Todo o militante político abnegado, aquele que serve e abraça a causa em que acredita, também vive dela. Viver dela e para a causa, é uma diferença muito imperceptível, já que uma se funde à outra.
Como poderemos ou deveremos duvidar da forma sincera ou não, dos que dedicam a sua vida por uma ideologia ?
Será correcto criticar ou condenar a sua nova condição social e económica ?
Será que ao conquistar um cargo, vindo a usufruir privilégios e recursos financeiros proibitivos à maioria dos seus colegas, não será por isso mesmo uma consequência natural da sua militância e ou competência ?
Não foram por acaso esses seus colegas e companheiros que o indigitaram e reconheceram para o desempenho desse cargo ?
Quanto maior a independência económica de um político, maior será a possibilidade de que este viva para a política; quanto menos independente, maior a tendência para se fazer da política um meio de vida, por outras palavras, para se viver dela.
Não é que se coloque em causa ou duvidemos da sinceridade dos idealistas e pragmáticos que vivem para a causa pública, apenas queremos realçar de que em concreto as suas necessidades impelem-nos e condicionam-nos a viverem da política. Esta passa a ser a forma de ascensão económica e social, possibilidade de emprego e ao mesmo tempo conciliar o exercício do poder.
É verdade que determinadas conjunturas sociais produzem uma geração disposta a viver de e para a política. O crescendo das lutas sociais, a demanda pelas liberdades democráticas e um certo idealismo romântico, empolgaram a velha e as novas gerações canalizando os seus sonhos e energias em torno das instituições partidárias, na esperança de uma oportunidade. No entanto, com o passar dos anos, a militância política torna-se, cada vez mais numa actividade restrita a uma clientela minoritária incrustada nos aparelhos institucionais dos partidos e do Estado.
É verdade que os partidos não se ressentiram com esta nova realidade, pelo contrário, os partidos profissionalizam-se aperfeiçoando o marketing e concentrando a sua acção mobilizadora ao aproximar dos processos eleitorais.
A velha militância que colava cartazes, pintava paredes, fazia as campanhas eleitorais e usufruía da vida e alma partidária nos períodos entre processos eleitorais, sente-se atraiçoada e esquecida em detrimento dos favores e clientelas de grupos e facções.
A conjuntura actual apresenta-se desfavorável para estes críticos, os quais apercebendo-se do expurgo a que os partidos e seus dirigentes os sujeitaram, dão origem a uma dissidência surda, levando-os ao encapsulamento político e partidário, optando por um caminho quantas vezes penoso e solitário.

Joao Carlos Soares

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