segunda-feira, novembro 11, 2013

O Cabo das Tormentas



Lendo e relendo as afirmações de Krugman, sobre as dívidas europeias, da Grécia, Portugal e Irlanda, em que fica no ar o espectro da falta de bom senso, como o mundo e a europa estão a ser governados, parece que só aos nossos governantes, e restante classe política, com responsabilidades de governação, estas afirmações não estão a convencer, ou então, sabendo o buraco em que meteram o país, tal como diz Krugman, ainda estão à espera da fada que irá produzir um milagre, que nos livre de uma catástrofe social, há muito anunciada.
Dos países em dificuldades, a Espanha, fugiu à masmorra a que Portugal se submeteu, tomou as medidas que entendeu serem necessárias, para equilibrar o barco e, passados dois anos, começam a ver a luz ao fundo do túnel, coisa que nós, muito dificilmente, poderemos ambicionar ver, se nada acontecer entretanto, que mude e contrarie as linhas de orientação política em curso, recolocando-nos no caminho do desenvolvimento e afirmação, de uma nação secular como a nossa.
Aos espanhóis foram pedidos sacrifícios, esforço combatido pelas populsções, mas aceite com o princípio da conservação e manutenção da soberania do país, não permitindo a ingerência de entidades externas, nem da União Europeia, na procura de soluções para ultrapassarem o desequilíbrio nas suas contas, o que não aconteceu com Portugal, por culpa dos nossos governantes, que capitularam e se submeteram, sem apelo nem agravo, às garras dos agiotas capitalistas, os quais em troca de dinheiro e promessas, destruíram toda uma cadeia de recursos, deixando-nos ainda mais dependentes do mercado e apoios externos.
Sujeitos às regras e compromissos celebrados entre o Estado Português e o triunvirato maldito da troika, sem qualquer resultado à vista, e contrariamente às afirmações dos nossos governantes, nada aconteceu, nem irá acontecer nenhum milagre, porque a economia é uma ciência criada pelos homens, onde um mais um, são dois e não talvez. Querem-nos fazer crer que, manipulando os números da dívida e desemprego e transferindo o ónus da dívida de uns para outros credores, a dívida diminuiria, o que não acontece, pois esta manter-se-á inalterada, e por vezes agravada, porque para pagar os juros desse dinheiro, nada resta para a peça fundamental na engrenagem do desenvolvimento de qualquer economia, que é o investimento, resultando daí a tributação nos lucros das empresas e nos salários da mão-de-obra criada em torno desses investimentos, no consumo e serviços prestados.
Prova deste descalabro europeu, porque é disso que se trata, são as alterações no mercado financeiro, que oscila constantemente, face às crises de confiança governamental, e não, face aos resultados económicos desses países. É a confiança, como diz Krugman, que dita os juros e regula as economias, como se na confiança ou desconfiança dos governantes, residisse a solução para os problemas de cada país.
Por aqui se pode aquilatar o ridículo a que se chegou, quando se misturam sensibilidades com matéria pura, nada que não se veja ou adivinhe, tal como não será nenhuma surpresa, o facto de que estes três países, nunca irão poder saldar as suas dívidas. Nesse pressuposto, com as notícias ultimamente veiculadas ao Ministério da Finanças, parte ou cerca de 50% das verbas do Fundo da Segurança Social, aquele dinheiro que os contribuintes ao longo da sua actividade profissional, depositaram à guarda do Estado Português, vai ser aplicado, na dívida pública portuguesa, sabendo-se já que será a mesma coisa que meter uma mão na boca do crocodilo, antes de um piscar de olhos, a mão já se foi, porque com estes protagonistas, o Estado deixou de ser uma pessoa de bem e sem palavra.
É triste que esta escumalha, sim porque de escumalha se trata, bandidos, aldrabões sem qualquer escrúpulo, salvaguardados pelas mordomias que construíram para usufruto dos próprios e dos seus correligionários, se banqueteiam perante a miséria e sofreguidão de uma população em desespero, votada ao abandono, desprovida de meios e sem esperança num futuro de privações e sem esperança.
A união dos países europeus, sonho defraudado por políticas premeditadas e sem nexo, subalternizadas ao poder de uma Alemanha de má memória, onde os sentimentos de vingança de uma capitulação militar, alimentam políticas de ambição desmedida, própria de sistemas neoliberais e fascistas, ditam as regras do mercado, sem respeito pela soberania dos países, numa europa adormecida e em total dependência económica e financeira, ligados a uma moeda altamente cotada, desequilibrando por isso a balança entre as matérias importadas e as exportadas, visto a Alemanha, ser o maior fornecedor de toda a Europa, resultado do desmantelamento das estruturas produtivas e de transformação desses países, aquando da sua adesão ao tratado europeu, tornando-as dependentes crónicas, de produtos e matéria-prima.
Os governos democraticamente eleitos em cada país deixaram de ser os decisores da vontade popular, e passaram a ser mandatários e executores de regras e imposições do Parlamento e Banco Central Europeu, dominado pela Alemanha, que se assume como o protetorado esclavagista dos restantes países, quase todos do Sul e antigos aliados na luta contra o domínio da Alemanha sobre a Europa, numa competição desenfreada com outras potências fora do eixo europeu, Estados Unidos, Rússia, China e Japão, que tendo dívidas públicas colossais, mostram o fracasso e a ineficácia do sistema selvagem capitalista, onde os ricos são cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais na miséria.
Não basta apregoarmos que estamos numa democracia, que escolhemos livremente os nossos representantes, se o resultado do desempenho desses representantes, não for coincidente com a defesa dos interesses, valores e condição de vida de quem neles delegou confiança e do país.
 Há que por termo a esta situação, impedindo que esta economia baseada num mercado controlado e condicionado pela Alemanha, alicerce ainda mais e implemente as suas raízes, porque estaremos a hipotecar a nossa independência, o desenvolvimento do país e, que terá como resultado, uma trágica realidade com exércitos de excluídos entre as camadas da população menos estruturada e socialmente debilitada, tão comum nos sistemas de exclusão social que caracteriza o capitalismo nas economias periféricas.
Ninguém acredite que estas medidas impostas a Portugal, vão criar o milagre português, como já ouvimos da boca de alguns ministros, pois toda a estratégia envolvida nos programas de apoio, são gizados e parametrizados com o objectivo de criar uma sociedade empobrecida, classista e de exclusão, criando-se um sistema de apartheid social, regredindo aos tempos que antecederam a industrialização, criando-se uma engrenagem de pobreza, sem emprego, e consequentemente abundância de mão-de-obra barata, com a consequente liberalização do mercado de trabalho, sem respeito pelos direitos e regalias dos trabalhadores.
É preciso hoje, mais do que nunca, fazer-se uma depuração dos conceitos de democracia, não permitindo a ascensão de determinadas terminologias que caem no domínio público, como a exclusão social ou os socialmente excluídos, o que por vezes provoca o desalento e capacidade dos cidadãos lutarem para serem elementos indispensáveis no processo produtivo, económico e subsequentemente, a chave no desenvolvimento do país.
Esperemos não vir a ser uma das pedras do dominó, que agora começa a cair, pedra-após-pedra, como refere Krugman, com as consequências que todos tememos. Por essa razão, mais que não fosse, é urgente que os cidadãos tomem consciência de que, continuando a escolher políticos sem palavra, estamos a ser coniventes com as posições e decisões por eles tomadas, que no caso presente, tudo indica, conduzirão o país a uma situação de rotura económica e social, cujo retorno poderá acarretar para todos nós o “Cabo das Tormentas”, as amarras a uma possível ditadura.
João Carlos Soares
Barreiro, 11 de Novembro de 2013

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