Colapso após colapso, Portugal vive debaixo de controvérsia e
esquizofrenia política, sobre o crescendo da inflação e a dependência ao
capitalismo de engenharia financeiro, convivendo de contradição em
contradição, em vez de tentar encontrar soluções que pudessem no futuro
vir a viabilizar e desenvolver a nossa economia.
A recessão em que toda a Europa se encontra mergulhada, e os empréstimos
que têm vindo a ser concedidos a Portugal, ao longo de várias décadas,
em vez de terem sido empregues no desenvolvimento e implementação de uma
política económica de sustentabilidade, baseada na capacidade de
actualização do nosso mercado interno, através da modernização das
nossas empresas de produção e transformação, optou-se por uma política
de patos bravos, enterrando fortunas em obras megalómanas, que depois de
terminadas, são entregues ao privado, acabando por deixar o nosso país
completamente endividado e sem capacidade para corresponder às
necessidades internas fundamentais, e impedidos de honrar os
compromissos financeiros com os seus credores, colocando e pondo em
causa a nossa própria soberania, enquanto Estado.
Se não estivéssemos comprometidos monetariamente, a solução seria fácil,
emitia-se mais dinheiro, o que não acontece infelizmente para mal dos
nossos pecados, e como a riqueza natural do país, pescas, agricultura,
metalomecânica, construção naval e marinha mercante, transformação e
produção de aço, indústria em geral, foram completamente aniquiladas,
por pressão dos parceiros da União Europeia, a troco de fundos, acaba
consequentemente no aumento dos bens essenciais de consumo e serviços,
face à necessidade de importação e quebra de salários, direitos
consignados pela Constituição e níveis de desemprego, nunca antes
vistos.
Toda esta crise inflacionária se deve a factores que estão intimamente
ligados à existência de dívidas. O endividamento do Estado, vem-se
reportando há já algumas décadas, vindo-se a agravar nos últimos anos,
face ao agravamento das condições da própria economia mundial.
As engenharias financeiras, implementadas pela banca e apoiadas por
sucessivos governos, criaram a ideia de um país supostamente
desenvolvido, vivendo acima das suas capacidades, com um produto interno
bruto deficitário, numa economia de casino, onde os especuladores
alimentaram o enriqueceram uma clientela internacional elitista, à custa
do endividamento e desmantelamento do aparelho do Estado, levando ao
descalabro das contas públicas.
Apesar de todas as circunstâncias de dimensões trágicas, para a Europa,
os países do eixo do norte, fortemente industrializados, alinharam-se
facilmente no mercado internacional, com as restantes potências
mundiais, como a China, Estados-Unidos e a Rússia. Já os países do sul,
como Portugal, Espanha, Grécia, Chipre, Irlanda, França e Itália, para
que fosse possível tornar as suas economias relativamente competitivas
em relação aos seus concorrentes comerciais, necessitaram de contrair
empréstimos.
Os sucessivos governos, desde o 25 de Abril de 1974, até agora, deveriam
ter acautelado o destino desses empréstimos, controlando e fiscalizando
de forma transparente os investimentos do Estado, no sentido de
protegerem a economia, promovendo o desenvolvimento autónomo e gradual
do Estado, permitindo de igual modo o investimento privado, por forma a
serem injectados recursos para que o país pudesse recuperar os anos de
atraso e isolamento, a que fora dotado por quarenta anos de ditadura
fascista.
Esta opção requeria projectos económicos de investimento, muito bem
elaborados que, apesar de resultarem de empréstimos contraídos, deveriam
ter levado em conta as oscilações do mercado internacional e a tentação
sempre presente da corrupção política, evitando assim um modelo de
desenvolvimento que, agora, se confirma ter sido gerado em bases
distorcidas e artificiais.
Pelo contrário, o que temos vindo a assistir, tem sido a um “fartar
vilanagem”, pagando juros de dívida com mais dívida, a qual se configura
já a níveis insuportáveis e incomportáveis para a saúde financeira do
nosso país.
Com todos estes erros e desmandos, constata-se que a economia e os seus
agentes não dão sinais de amadurecimento, a inflação sobe dia-após-dia,
transformando-se qual fera indomável, ultrapassando tudo o que se possa
imaginar, os números de falências e desemprego são assustadores, sem que
os responsáveis assumam os seus erros, e respondam pelas suas
consequências.
O sistema capitalista mundial, na sua génese está em crise e já não é
auto-sustentável, as grandes conjunturas financeiras globais estão
interligadas, num mercado de transacções estimulado pelo desenvolvimento
das novas tecnologias em tempo real, num processo de mundialização, que
ameaça as economias dos países menos desenvolvidos e dependentes, numa
crise que sendo conjuntural, também é estrutural, com consequências
sociais imprevisíveis.
Para resolverem a crise que os afecta, os países com uma economia
dominante, e os grandes centros financeiros, através dos seus órgãos e
instituições reguladoras, como o FMI, o Banco Mundial e a Organização
Mundial do Comércio, tentam subjugar, a qualquer custo, os países mais
dependentes e hipotecados, como Portugal, Grécia e Chipre, através da
imposição de medidas e políticas neoliberais, em total afronta e
desrespeitando a soberania desses países, interferindo em áreas
estratégicas, condicionando os investimentos estrangeiros, nesses
países, controlando o acesso aos mercados, à propriedade intelectual,
legalização de transgénicos, tudo em nome do desenvolvimento económico,
com custos sociais incomensuráveis dos cidadãos.
Com a desculpa de equilibrar as finanças e reduzir a pobreza, impõem
normas austeras para que os países cumpram com a obrigação de ajustar as
suas economias, o que leva forçosamente a políticas contrárias ao
Estado Social, com as consequências já por nós conhecidas, com cortes
significativos nas áreas de apoio social e aumento de tributação fiscal,
a abertura do comércio e do sistema financeiro de cada país,
desestruturando as empresas nacionais sobreviventes, e a consequente
redução de postos de trabalho, para assim cumprirem com o envio de
remessas para honrar o pagamento dos altos juros da dívida, prometidos
por essas instituições aos investidores internacionais.
Através da privatização de todo o aparelho do Estado, que ainda é
rentável, com a venda indiscriminada das empresas estatais e nacionais
ao capital internacional privado, acaba destruindo o pouco da
independência em sectores estratégicos da economia que os países ainda
possuíam.
No fim de tudo isto, resume-se a uma simples questão, que se chama
sobrevivência. A relação entre a dívida externa e as reformas, levam as
economias dos países intervencionados, a se sujeitarem a todo o tipo de
obrigações financeiras, numa estratégia de empobrecimento dos cidadãos,
com uma engenharia de reescalonamento da dívida, adiando as medidas que
poderiam contribuir para o desenvolvimento desses países, a troco da
obrigatoriedade no pagamento do juros dessa dívida, com dinheiro novo,
que é emprestado aos países em dificuldades, para pagamento dos juros de
débitos anteriores.
Para que este ciclo viciado se complete e concretize, para que esses
países possam receber os novos empréstimos, que irão servir para pagar
esses juros, obrigam-se e submetem-se às condições de reforma
estruturais e prazos de pagamento impostos, pelas comissões de
avaliação, aumentando assim o enorme fosso, que já hoje existe, entre os
países pobres e os países ricos, sem nunca conseguirem saldar a dívida,
numa disputa tecnológica de mercados onde a concentração de capital
provoca, cada vez mais e em definitivo, desigualdades imensas entre os
países, regiões e classes.
João Carlos Soares
Barreiro, 09 de Julho de 2013
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